A segunda maior economia do mundo continua a dar sinais de fraqueza e julho trouxe novo recorde negativo no que respeita ao comércio internacional, um dos principais motores do crescimento chinês nas últimas décadas: as exportações caíram ao ritmo mais pronunciado desde fevereiro de 2020, um recorde que já havia sido batido no mês anterior, ao passo que as importações também voltaram a diminuir em termos homólogos. Os dados preocupam analistas e investidores e os números da inflação esta quarta-feira podem adensar os receios de que a China seja incapaz de atingir o objetivo menos ambicioso para o crescimento em largos anos, com Pequim em dificuldades para chegar aos 5% este ano.
Os dados do comércio internacional voltaram a pintar um cenário claramente negativo: as exportações caíram 14,5% em comparação com julho do ano passado, uma descida ainda mais pronunciada do que a redução de 12,5% esperada pelo mercado ou do que os 12,4% do mês anterior. Já as importações ficaram 12,4% abaixo do registado no período homólogo de 2022.
Em detalhe, as vendas aos EUA, o maior parceiro comercial da China, caíram 23,1% em termos homólogos, enquanto para a UE foram menos 20,6% do que há um ano. Com os países da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), as trocas comerciais em julho diminuíram 21,4%.
Olhando para este ano, as exportações chinesas caíram 5% nos primeiros sete meses de 2023 comparando com igual período de 2022, um número ainda maior quando analisando apenas a relação com os EUA, a quem as vendas este ano são 13% mais baixas em termos homólogos.
Do lado das importações, estas caíram 7,6% em relação ao ano passado, sendo de destacar a redução homóloga de 20,8% nas compras de petróleo em julho, bem como a queda de 17% nas compras de circuitos integrados.
Apesar do cenário negativo pintado pelos números, os analistas da Capital Economics ressalvam que a queda de julho se deve “sobretudo a preços mais baixos, e não a volumes menores” de bens e serviços transacionados. Ainda assim, os especialistas do think-tank “não estão convencidos que esta tendência se mantenha, dada a ampla evidência de que a procura global está em queda” com o aperto monetário em curso no Ocidente.
Como tal, a queda do lado das importações preocupa mais do que do lado das exportações, continua a Capital Economics. Se do lado das vendas chinesas “os exportadores têm cortado preços para manter a sua quota de mercado”, o recuo nas importações sinaliza uma quebra ainda mais pronunciada da procura interna do que se esperava. Projetando os próximos meses, é expectável que as exportações continuem a cair, dadas as fracas perspetivas para a procura nos principais mercados para onde as empresas chinesas exportam.
Já o Nomura destaca a pressão que a falta de investimento direto estrangeiro tem colocado sobre os exportadores do país, “dado que cerca de 30% das exportações totais da China são da responsabilidade de empresas estrangeiras”.
O investimento tem estado na mira das autoridades, que pretendem revitalizar esta rubrica do PIB, mas procurando não agravar ainda mais a elevada dívida do país. A expectativa por medidas generalizadas de apoio, sobretudo orçamental, decretadas por Pequim parece cada vez mais destinada a acabar frustrada, com o foco do Governo central colocado na redução do endividamento.
Isso mesmo foi reconhecido por responsáveis chineses em julho, quando prometeram ajudar os governos locais a reduzirem a sua dívida, embora sem detalharem o plano. A dívida combinada dos governos regionais chegou a 76% do PIB em 2022, uma subida considerável em relação aos 62,2% de 2019, depois de anos de sobreinvestimento, sobretudo em imobiliário, e faturas crescentes da política de contenção pandémica.
Outro capítulo que tem preocupado investidores é a inflação. Em claro contraciclo com as economias ocidentais, a China arrisca-se a viver mesmo um cenário de deflação, ou seja, de redução generalizada de preços, dada a crise de confiança entre os consumidores e a quebra de rendimento disponível. Os dados desta quarta-feira devem marcar um agravamento desta dinâmica, com o mercado a projetar uma leitura de -0,4% em cadeia, depois da estagnação em junho.
Combinada com um consumo em queda (que, aliás, contribui para agravar a dinâmica de deflação, visto que os vendedores cortam preços para estimular a procura, e os consumidores, esperando preços mais baixos, adiam compras mais significativas) e desemprego jovem em máximos históricos, a margem para Pequim atingir os 5% de crescimento a que se propõe vai caindo.