A robustez do mercado laboral nos últimos anos e os ganhos que daí têm surgido para a economia nacional em muito se devem aos imigrantes que escolhem Portugal, defendeu Mário Centeno, reforçando uma das conclusões do boletim económico apresentado sexta-feira. O governador do Banco de Portugal (BdP) sublinhou o impacto que estes trabalhadores têm no crescimento do país, pedindo respeito pelos mesmos uma altura em que o emprego tem sido o aspeto mais positivo há largos trimestres da economia portuguesa.
“Há um papel determinante da imigração e que todos devíamos respeitar em Portugal no aumento da oferta de trabalho”, defendeu, argumentando que “não é possível na Europa colocarem-se modelos de crescimento sem um adequado contributo da imigração”. Tal torna-se ainda mais importante tendo em conta o impacto que o mercado de trabalho tem tido na capacidade da economia nacional de resistir a choques externos negativos nos últimos anos, choques esses que têm abundado.
As afirmações secundam o tema em destaque divulgado no início da semana em antecipação ao boletim económico de junho, publicado sexta-feira, que destaca a subida de 2,1% em 2014 para 13,4% em 2023 do peso da mão-de-obra estrangeira no total do emprego nacional. Na mesma linha, “entre 2019 e 2023, o número de trabalhadores por conta de outrem registados na Segurança Social cresceu 13,0%, com um contributo de 9,3 pontos percentuais (p.p.) atribuível aos trabalhadores de nacionalidade estrangeira”.
Estes trabalhadores são, em média, mais baratos, isto apesar da tendência crescente nas qualificações dos mesmos. Segundo a análise do BdP, apenas no sector das atividades de informação e comunicação e apenas para trabalhadores com mais de 35 anos é que o salário médio de um imigrante supera o de um português, sendo também o sector onde a remuneração média dos trabalhadores estrangeiros é mais elevada.
“O mercado de trabalho tem sido a chave de tudo o que de bom nos tem acontecido”, frisou Mário Centeno, lembrando os máximos de população empregada que se têm registado e os 500 mil empregos criados pela economia nacional a nível trimestral.
Novas medidas e OE 'comem' margem orçamental
Apesar do elogio do lado laboral, o BdP deixou alguns avisos quanto à situação orçamental do país. Em particular, e apesar de assumir que o exercício se aproxima a um cenário de políticas invariantes, as novas medidas anunciadas pelo Governo e Parlamento já superam a margem orçamental existente, isto num ano em que voltam as regras de Bruxelas para o défice.
“Com o Orçamento do Estado para 2024 (OE2024) e as medidas que já foram implementadas este ano e conseguimos incluir no exercício, que são fundamentalmente o impacto do CSI e o fim das portagens nas ex-SCUT […], verifica-se um incumprimento de 0,6%, acima da margem de 0,3% da Comissão”, afirmou Mário Centeno na apresentação das projeções macroeconómicas atualizadas do banco central.
O exercício do BdP fala num aumento da despesa de 5.635 milhões de euros, o que, por si só, já excede a margem orçamental, aos quais se junta uma redução de receita de 1.820 milhões de euros.
“Deste modo, a variação do referencial para a despesa ascende a 7.455 milhões de euros. Contudo, ficam fora deste exercício as diversas medidas com impacto orçamental significativo ainda em fase de negociação que abrangem mais de 220 mil trabalhadores da administração pública, os planos de emergência nas áreas da saúde e habitação, entre outras medidas sectoriais de menor dimensão”, lê-se no boletim.
Contudo, o governador do BdP procurou frisar que este exercício não correspondia a uma projeção macroeconómica, até porque “há desfasamentos na aplicação das medidas, medidas de compensação que podem e devem ser sempre consideradas”.
“Se essas medidas não aparecerem, a nossa avaliação é que não existe margem para aquilo que está a ser apresentado, mas isso só se sabe no fim”, ressalvou, destacando, contudo, que “quando começamos a somar os números conhecidos, eles exauram o excedente orçamental com muita facilidade”.
O Boletim Económico de junho, apresentado sexta-feira, reviu em ligeira alta a inflação, embora mantendo o crescimento inalterado. O indicador de preços deve crescer 2,5% este ano e 2,1% no próximo, uma revisão em alta de 0,1 p.p. em ambos os casos. Também a inflação subjacente foi atualizada em alta, fechando este ano e o próximo em 2,3%.
O banco central continua a projetar um avanço do PIB de 2,0% este ano, tal como no anterior boletim, valor que sobe para 2,3% em 2025 antes de cair para 2,2% no final do horizonte da projeção, em 2026.