A subida dos juros veio dar um impulso às margens da banca no último ano, catapultando os resultados para níveis que permitiram colocar os rácios de capital em níveis confortáveis. Mas este efeito positivo vai agora começar a atenuar-se com a inversão da política monetária do Banco Central Europeu (BCE). Uma descida das taxas que se verifica num período que tem também sido marcado por menos procura por crédito à habitação. O Banco de Portugal alerta que o sector financeiro tem de conter o impacto negativo na margem financeira ao mesmo tempo que mantém os mesmos níveis de prudência na concessão de financiamento.
“Perante um cenário central de redução futura das taxas de juro, é expectável que a margem financeira se venha a reduzir”, começa por afirmar o Banco de Portugal no mais recente relatório de estabilidade financeira apresentado esta terça-feira. Os maiores bancos nacionais, nomeadamente a Caixa Geral de Depósitos, Santander, Novobanco e BPI, viram, no seu conjunto, a margem a crescer 20% nos primeiros meses deste ano. “O aumento expressivo da margem financeira resultou, em larga medida, de a subida dos juros recebidos exceder a subida dos juros pagos”, refere o regulador.
Contudo, este crescimento deve agora abrandar, com a perspetiva de alívio do BCE a começar a refletir-se numa redução da prestação da casa. A taxa Euribor a seis meses, que passou a ser a mais utilizada em Portugal nos créditos à habitação com taxa variável, situa-se nos 3,749%, um novo mínimo desde junho do ano passado, enquanto a taxa a 12 meses está nos 3,722% depois de ter ficado acima dos 4% durante vários meses. É neste cenário que a entidade liderada por Mário Centeno pede que as instituições financeiras tomem medidas para mitigar o efeito negativo da descida dos juros na margem.
“Com a redução prevista das taxas de juro, os bancos portugueses devem conter o impacto negativo sobre a margem financeira, dada a sua importância na estrutura de proveitos”, refere no relatório, frisando que a “preservação da margem financeira dos bancos é muito relevante para sustentar a geração de capital de forma orgânica, via que tem sido privilegiada na criação de buffers de capital”. Nesse sentido, “num quadro de redução das taxas de juro e subsequente aperto da margem financeira importará que os bancos portugueses consigam encontrar mitigantes, dada a sua importância na estrutura de resultados”.
Bancos têm de manter a prudência na concessão
A descida dos juros acontece ao mesmo tempo que se observa uma quebra na procura por crédito à habitação. Apesar de ser um cenário em que há menos negócio, ao mesmo tempo que os juros descem - e, logo, a margem perde impulso - o regulador alerta que o sector financeiro tem de continuar a ser prudente na concessão de crédito.
“É a natureza do negócio bancário saber gerir a sua atividade ao longo do ciclo económico”, afirmou Clara Raposo durante a apresentação do relatório, destacando que os “bancos têm a obrigação de fazer uma gestão muito criteriosa e fazer um acompanhamento muito adequado” dos clientes. A vice-governadora do Banco de Portugal referiu ainda que apesar de os juros do BCE ainda não terem descido, as taxas Euribor já começaram a recuar e que a redução na procura por crédito à habitação verificada em 2023 parece estar a querer inverter-se este ano. “É uma questão de ir gerindo o ciclo e fazendo-o sempre com os melhores critérios”, rematou.
Ao mesmo tempo que a banca tem de gerir um cenário de descida dos juros, e o impacto que isto tem nas suas margens, há ainda outros desafios para o sector. Apesar de reconhecer que, “no último semestre, observou-se uma redução das vulnerabilidades, em resultado da melhoria das condições económicas”, o relatório de estabilidade financeira referente a maio indica que “os riscos para a estabilidade financeira decorrem, em larga medida, das consequências que as tensões geopolíticas e o prolongamento da restritividade das condições monetárias possam ter na atividade económica”.
O “contexto geopolítico de conflitualidade e o novo ciclo político em países relevantes poderão impactar a atividade económica, tal como a persistência de condições monetárias restritivas ou com efeitos mais prolongados do que antecipado”, refere, destacando ainda, no plano nacional, os “riscos associados a um cenário de maior incerteza na condução da política económica, no quadro de um novo modelo de regras orçamentais europeias, que colocarão novos desafios à condução da política orçamental”, mas também associados à execução dos fundos europeus.