O Banco de Portugal (BdP) vai obrigar os principais bancos, com exceção da CGD, a constituirem uma reserva de capital para lidarem com um eventual aumento do malparado no crédito à habitação, caso ocorra uma crise no imobiliário. Esta reserva de capital deverá dificultar o pagamento de dividendos pelos principais bancos privados, após um ano em que atingiram resultados recorde devido à forte subida das taxas de juro.
A imposição desta reserva no valor de 4% da carteira de crédito a particulares que tenha imóveis residenciais como garantia foi ontem anunciada pelo Banco de Portugal, com o objetivo de aumentar a resiliência do sistema financeiro perante o risco sistémico específico associado ao mercado imobiliário.
A medida deverá condicionar a intenção, já tornada pública pelo BCP, Santander, BPI e Novobanco, de distribuirem dividendos aos seus acionistas no final deste exercício. Até ao final de setembro, os cinco maiores bancos (incluindo a CGD) já registaram lucros de 2,3 mil milhões de euros, mais 27% que no período homólogo, prevendo-se que encerrem o ano com lucros recorde.
Recorde-se que, na semana passada, o governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, defendeu que a banca nacional deve aproveitar os lucros elevados gerados pela subida das taxas de juro para se precaver contra uma eventual deterioração da conjuntura macroeconómica. E também o Fundo Monetário Internacional (FMI) aconselhou os bancos portugueses a serem cuidados na distribuição de dividendos, pedindo que constituam almofadas de capital para fazerem face ao eventual aumento do crédito malparado no próximo ano, devido à desaceleração da economia europeia e ao impacto das taxas de juro elevadas nas famílias e nas empresas.
“É necessário que os bancos sejam capitalizados, inclusive os bancos portugueses, e estamos a sugerir que os bancos na fase atual aumentem os seus fundos próprios e as suas reservas de capital e que se abstenham, na medida do possível, de pagar todo o acréscimo dos lucros através de dividendos”, disse o diretor do FMI para a Europa, Alfred Kammer, num encontro com jornalistas em Bruxelas, citado pela Lusa.
Entre os cinco maiores bancos, o Santander, o BCP, o Novobanco e o BPI terão de constituir esta reserva, uma vez que utilizam o método IRB para fazerem o cálculo do capital regulatório. Já a Caixa Geral de Depósitos (CGD), que utiliza o método padrão para calcular o capital regulatório para fazer face ao risco de crédito, não será abrangida por esta imposição. Esta diferenciação deve-se ao facto de o método IRB implicar ponderadores de risco mais baixos do que os utilizados pelos bancos que usam o método padrão.
“As instituições abrangidas pela medida apresentam reservas de gestão suficientes para acomodar a introdução da reserva para risco sistémico setorial. Desta forma, estima-se que a reserva pode ser constituída sem prejudicar o cumprimento dos demais requisitos e orientações prudenciais ou a atividade de concessão de crédito destas instituições”, referiu o Banco de Portugal em comunicado, referindo que a medida entrará em vigor a partir de 1 de outubro de 2024, sendo revista com a periodicidade mínima de dois anos.
O Banco de Portugal refere que esta imposição tem uma natureza preventiva e “visa aumentar a resiliência das instituições perante uma potencial materialização futura de risco sistémico no mercado imobiliário residencial em Portugal”.
“Num cenário de materialização do risco, esta reserva pode ser libertada para contribuir para a manutenção de concessão de crédito à economia. Neste sentido, o Banco de Portugal anunciará o período durante o qual não é expectável um aumento desta reserva”, refere a instituição liderada por Mário Centeno em comunicado.