Dos 839 milhões de euros que a Comissão Europeia identificou como sendo apoios ilegais a empresas instaladas no Centro Internacional de Negócios (CINM) da Madeira, ou Zona Franca (que engloba Serviços Internacionais, Zona Franca Industrial e Registo Internacional de Navios), a Autoridade Tributária (AT) só conseguiu recuperar 66 milhões de euros, o que corresponde a 8% do valor total, de acordo com um relatório do Tribunal de Contas (TdC).
Estes 839 milhões de euros que a Autoridade Tributária (entidade designada pela Comissão Europeia para recuperação dos auxílios) tem a missão de recuperar, como indica o TdC, são relativos a 302 contribuintes e 1.013 liquidações, para um período temporal que abrange os anos de 2009 a 2022.
Desse total nove milhões de euros foram considerados não recuperáveis e correspondem a 83 liquidações, salienta o TdC.
“Das restantes 930 liquidações: 177 ainda estão por emitir (273 milhões de euros), 44 aguardam processamento e notificação do contribuinte (32 milhões de euros) e das 709 já liquidadas e em que o contribuinte já foi notificado, de um valor estimado de montante a recuperar de 525 milhões de euros, foram emitidas liquidações no valor de 515 milhões de euros. Relativamente a estas liquidações, os contribuintes procederam ao pagamento de 66 milhões de euros e até 29 de maio de 2024 a Autoridade Tributária já procedeu à emissão de 492 certidões de dívidas relativas a liquidações não pagas”, explica o TdC.
Investigação da Comissão Europeia conclui terem existido auxílios ilegais
Todo este processo, que envolve a Zona Franca foi despoletado por uma investigação da Comissão Europeia, de 2020, que determinou terem existido auxílios ilegais a empresas instaladas na Zona Franca da Madeira, ao abrigo do regime III do CINM.
O Tribunal de Justiça Europeu, rejeitou, em julho deste ano, o recurso apresentado pelo Estado português, relativo à conclusões da Comissão Europeia sobre os apoios concedidos a empresas instaladas na Zona Franca. Em setembro de 2022 foi também rejeitado, pelo Tribunal Geral da União Europeia, o recurso que Portugal apresentou sobre a decisão da Comissão Europeia.
A Autoridade Tributária foi a entidade mandatada para recuperar os auxílios considerados ilegais pelas instâncias europeias.
Regime III previa taxas de IRC entre 3% e 5%
O regime III da Zona Franca, o regime que foi investigado pela Comissão Europeia, abrangeu as entidades licenciadas a partir de 1 de janeiro de 2007 e até 31 de dezembro de 2013, para o exercício de atividades industriais, comerciais, de transportes marítimos e serviços de natureza não financeira.
Este regime definia a tributação em IRC a 3% (empresas licenciadas entre 2007 a 2009), valor que subia para 4% para empresas licenciadas entre 2010 a 2012, e para os 5% para as empresas licenciadas a partir de 2013. Este regime produzia efeitos até 2020.
O regime manteve também as entidades que estavam licenciadas para operar na Zona Franca Industrial (ZFI) com uma dedução de 50% à coleta do IRC, desde que cumpridas determinadas condições, nas quais se incluíam critérios, como por exemplo: modernização e diversificação da economia regional, a fixação de recursos humanos, a melhoria das condições ambientais e a criação de postos de trabalho.
As entidades, no caso de serviços internacionais, para beneficiarem de uma taxa reduzida de IRC, tinham que iniciar a sua atividade no prazo de seis meses a contar da data de licenciamento, e de um ano, no caso de atividades industriais ou de registo marítimo.
Para beneficiar da taxa reduzida necessitavam de cumprir um dos seguintes critérios: criar entre um a cinco postos de trabalho, nos primeiros seis meses de atividade, e realizar um investimento mínimo de 75 mil euros nos primeiros dois anos de atividade; ou em alternativa criar seis ou mais postos de trabalho nos primeiros seis meses de atividade.
Contudo existia limitação ao benefício consoante os postos de trabalho criados: dois milhões de euros pela criação de um até dois postos de trabalho; 2,6 milhões de euros pela criação de três até cinco postos de trabalho; 16 milhões de euros pela criação de seis até 30 postos de trabalho; 26 milhões de euros pela criação de 31 até 50 postos de trabalho; 40 milhões de euros pela criação de 51 até 100 postos de trabalho; e de 150 milhões de euros pela criação de mais de 100 postos de trabalho.
Dos benefícios ficaram excluídas as atividades de intermediação financeira, de seguros e das instituições auxiliares de intermediação financeira e de seguros, e atividades do tipo “serviços intragrupo”, como por exemplo centros de coordenação, de tesouraria e de distribuição.