No final de setembro de 2022, a sociedade de advogados Antas da Cunha Ecija integrou Paulo Morgado, ex-CEO da consultora Capgemini em Portugal e Espanha, como sócio e criou a unidade de Technology Transactions, para acompanhar as empresas nos processos de transição digital. Quase dois anos depois, o projeto é classificado como “um sucesso acima do esperado”.
“Aquilo que nós conseguimos foi ajudar muitas empresas que precisavam de ser ajudadas e ainda não tinham consciência de que precisavam de um certo serviço”, diz Paulo Morgado, em declarações ao Jornal Económico (JE).
Quando a nova unidade foi apresentada, Fernando Antas da Cunha, managing partner da Antas da Cunha Ecija, explicou-a como uma adaptação à evolução das necessidades das organizações nos processos de decisão relacionados com a tecnologia, quando a transformação digital passou a estar na ordem do dia.
“A Antas da Cunha Ecija percebeu que o mundo da tecnologia estava a mudar significativamente”, diz Paulo Morgado.
“Primeiro, percebeu uma coisa que, se calhar algumas empresas já perceberam, outras vão perceber com dores futuras, que é que a percentagem de tecnologia numa organização, a percentagem de tecnologia que vai contribuir para a estratégia de uma empresa, para a eficiência de uma empresa, vai ter um crescimento exponencial”, explica. “Se algumas empresas achavam que já gastavam muito ou investiam muito em tecnologia e se acham que isto vai abrandar, não vai abrandar, vai subir exponencialmente. Esta é a primeira tendência”, avisa.
Morgado, que fundou a plataforma digital de consultoria Bridgewhat e que acompanhou diversos projetos tecnológicos como consultor, refere como uma segunda tendência a mudança cada vez mais rápida nas tecnologias de informação [TI].
“Não só as empresas estão cada vez mais dependentes das TI, como essas próprias TI vão mudar a uma velocidade muito grande. Aquilo que hoje era uma solução interessante, quer em termos, digamos assim, da infraestrutura tecnológica, quer em termos de uma solução de negócio, vai tornar-se obsoleta num espaço de tempo bastante mais curto do que antigamente”, aponta.
Depois, acrescenta que a Antas da Cunha Ecija percebeu que, neste quadro de aceleração dos processos de digitalização e de renovação constante de soluções tecnológicas, os fabricantes de software e os integradores. “Quem faz os projetos de integração de software nas empresas tem uma vantagem muito grande em termos de conhecimento tecnológico face àquilo que são as empresas em geral”, explica ao JE, acrescentando que “essa vantagem dá-lhes uma outra que é a de estar a fazerem contratos que as pessoas ainda não percebem bem como é que funcionam”.
“As empresas em geral têm de lidar com duas coisas que andam a uma velocidade muito grande e que são muito complexas: a velocidade tecnológica, de evolução, e a velocidade a que estes fabricantes fazem modificar os seus contratos”, sublinha, exemplificando: “Vamos imaginar que eu compro um contrato de software as a service, eu deixei de ter as máquinas onde funciona o software, quem as tem é a quem eu estou a comprar. Se eu não quero saber que máquinas é que são, que capacidades é que têm, que velocidades é que têm, quando for perguntar, já assinei o contrato, é tarde demais. Se eu não quiser saber qual é o nível de serviço que tenho, ou seja, quando aquilo vai abaixo, quanto tempo é que demora a pôr em cima e qual é a penalidade que tem quem me disponibiliza, quando eu for perguntar, é tarde demais”. “Isto não são temas que tenham a ver com o direito, mas são temas que têm a ver com a forma com que se formam esses contratos”, regista.
É neste processo que a unidade de Technology Transactions da Antas da Cunha Ecija se posiciona como apoio à decisão.
Paulo Morgado considera que a sociedade de advogados se está a posicionar à frente do mercado, porque integra mais valências e procura acompanhar mais de perto a decisão nos processos relacionados com a tecnologia.
“Demos um passo muito grande, também através da multidisciplinaridade”, diz. “A Antas da Cunha Ecija é uma sociedade multidisciplinar, tem pessoas como eu; apesar de ser jurista, não sou advogado, mas levo a área de tecnologia, uma das partes da área da tecnologia, que é esta parte de contratos, pelo conhecimento que tive de 20 anos de trabalhar numa empresa de tecnologia”, acrescenta.
Decisão em TI passo a passo
Na metodologia que segue na unidade de Technology Transactions, Morgado refere que os clientes são convidados a cumprir etapas “a montante e a jusante do contrato”, que ajudam a uma melhor decisão.
Primeiro, diz, é preciso perguntar: “Eu preciso mesmo desta solução? Eu preciso mesmo de uma solução desta marca? Não há outras marcas que me ofereçam a mesma funcionalidade? O que é que estou a comprar? Quando eu compro uma ferramenta de gestão de recursos humanos, o que é que isto tem incluído? Começamos por uma clarificação do que é que se está a comprar e tentar pôr pessoas que falam linguagens diferentes dentro das organizações a compreender o que estão a comprar, porque o CEO não tem uma linguagem tão técnica como o CIO [Chief Information Officer], o responsável tecnológico; o utilizador, digamos assim, a área de negócio que vai utilizar a ferramenta nem quer saber de tecnologia, só quer saber da funcionalidade; o jurista não tem tempo para estudar todas estas condições gerais”, retrata. “Nós, no fundo, estamos aqui a fazer quase trabalho de semilei, porque se os grandes fabricantes – eu não quero nomear nenhum, embora haja alguns no mercado que atuam em quase situação de monopólio – modificam em cada três meses as suas condições gerais, quem não andar atrás delas não sabe o que é que está a comprar”, sinaliza.
“Comprar tecnologia é comprar a tecnologia e os contratos que lhe estão associados”, reforça.
Morgado sequencia as etapas, depois das questões iniciais, que definem o tipo de tecnologia, com a decisão sobre a capacidade que se pretende e, a seguir, o preço. “O tema de preço chateia muitas empresas que estão no mercado, porque nós acabamos por ter benchmarks, que, naturalmente, são ultraconfidenciais, mas [que indicam] se os preços que estão a ser praticados são caros ou não são caros e, além disso, eu ao viver Espanha tenho um benchmark que é o mercado espanhol onde as empresas da IT foram bastante mais apertadas pelas empresas que utilizam os seus serviços e softwares do que em Portugal e, portanto, os preços em Espanha têm tendência para ser bastante mais baixos”, diz.
De seguida, é preciso garantir que a instalação é feita e que “aquilo que foi prometido como output tenha sido integralmente cumprido”.
“Nós, no fundo, asseguramos este trabalho de know-how, que nos obriga a estar a estudar constantemente a evolução tecnológica”, diz Paulo Morgado. “O que nós queremos no final do dia é o que nós dizemos sempre que é maximizar o value for money do Capex e Opex [despesas de capital e despesas operacionais] das empresas em TI”, acrescenta.
“Quem continuar a achar que pode fazer contratos de uma complexidade brutal como quem compra um produto que já existe há 50 anos e não mudou, está redondamente enganado sobre as necessidades que o mundo atual impõe neste tema da negociação contratual”, conclui.