Em junho do ano passado, foi lançada pela EMER uma consulta pública de que veio a resultar na publicação, ainda em Dezembro, do Decreto-lei 99/2024, que transpôs parcialmente a Directiva (UE) 2023/24113 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Outubro de 2023 (a designada RED III) que determina um conjunto alargado de medidas – algumas até com prazos de transposição concretos, como era o caso da consagração do principio do interesse público superior na avaliação ambiental.
Não foram, contudo, incorporadas no Decreto-Lei 15/2022, de 14 de Dezembro, todas as medidas da RED III, ou porque não houve tempo para as amadurecer, ou porque obrigam a alterações de outros regimes, legais para além do regime da organização e funcionamento do sector eléctrico nacional constante daquele diploma legal.
Este momento é, em minha opinião, um momento importante para, aproveitando a transposição que falta fazer, resolver muitas das questões que neste momento ainda impedem a implementação de (mais) projectos no sector da energia, desde solar, autoconsumo, até à biomassa e aos gases renováveis.
Não vou aqui listar medidas, nem fazer considerações sobre o que deve ou não ser feito, mas apenas chamar a atenção para aquilo que me parece ser um dos pilares para a aceleração dos projectos: as designadas pela RED III, zonas (ou áreas) de aceleração da implantação das energias renováveis (“ZAER”), também chamadas go-to-areas.
Como em muitos outros casos, em Portugal, até fomos antecipando esta medida pois já existe um mapeamento elaborado pelo Grupo de Trabalho para a definição das Áreas de Aceleração de Energias Renováveis (GTAER), criado em Novembro de 2023, mas falta agora concretizar e dar-lhe(s) forma legal. Ou seja, já temos uma avaliação do potencial de áreas considerando a exclusão ou não de determinadas condicionantes, designadamente áreas de RAN (Reserva Agrícola Nacional) e de REN (Reserva Ecológica Nacional) disponíveis, mapeamento esse que pode, desde já, facilitar e contribuir para a definição das go-to-areas.
A Directiva prevê que a aprovação das go-to-areas seja feita através de instrumentos de gestão territorial (planos) que devem designar zonas em que não se espera que a implantação de projectos tenha um impacte ambiental significativo e estabelecer regras quanto às medidas de mitigação a adoptar e aos activos necessários às ligações das centrais à rede.
Ora, o nosso regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial combinado com o regime de avaliação ambiental estratégica contém tudo quanto é necessário para dar forma a esta medida. As ZAER podem ser aprovadas por um (ou mais) Programa Sectorial que é um instrumento de gestão territorial de âmbito nacional o qual deve ser obrigatoriamente sujeito a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE). É importante que estes Programas Sectoriais considerem as condicionantes já avaliadas pelo GTAER mas, se possível, avaliem as demais condicionantes, designadamente as constantes dos PDM’s que intersectam essas áreas.
A AAE desses Programas (leia-se das ZAER) trará duas importantes consequências: a presunção que os projectos específicos das centrais (e das ligações à rede) não têm impactes significativos no ambiente e como tal podem ser dispensados de avaliação de impacte ambiental pela APA caso esta, em apreciação prévia, verifique que cumprem as medidas de mitigação previstas; a presunção de que tais projectos são compatíveis com os PDM’s das áreas onde vão ser implantados dado que as mesmas são aprovados por um instrumento de gestão territorial de âmbito nacional.
É, pois, com muita expectativa que o sector aguarda as alterações legislativas sob o comando da EMER que, parece-nos, está a conduzir este processo de forma ponderada e a ouvir as preocupações dos stakeholders. O país precisa de soluções práticas que venham efectivamente permitir ultrapassar os constrangimentos actuais. E, como se costuma dizer, não há nada mais “práctico” do que uma boa legislação.