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Jorge Pavão de Sousa, Eleven Sports: "Todas as operadoras estão em pé de igualdade"

Em entrevista ao JE, o diretor-geral da Eleven Sports Portugal revelou que as decisões iniciais da distribuidora não terão sido as mais acertadas, na abordagem ao mercado nacional. Mas desde dia 12 de fevereiro todos estão em pé de igualdade. As negociações com as operadoras levaram meses, sendo mesmo necessária a intervenção do proprietário da empresa, Andrea Radrizzani.

A Eleven Sports Portugal está disponível nas ofertas dos principais operadores de telecomunicações há pouco mais de um mês, após um processo negocial de avanço e recuos ao longo de mais de cinco meses desde que a empresa começou a operar. Todo o processo ficou marcado por dois momentos-chave: primeiro, a cedência dos direitos de distribuição à Nowo; segundo, o cut-off dessa cedência.

Nesse volte-face, "terá pesado o facto de as decisões iniciais da Eleven Sports, ao entrar no mercado nacional, não enquadrarem bem o que seria ter uma operadora, concorrente das outras operadoras, a liderar as negociações", contou o diretor-geral da Eleven Sports Portugal ao Jornal Económico.

Em entrevista, Jorge Pavão de Sousa detalhou ainda como foi chegar a acordo com Nowo, Nos, Vodafone e Meo, embora nunca tenha revelado quantos subscritores têm os canais da Eleven Sports, "por uma questão de confidencialidade com as operadoras", embora o próprio tenha revelado que o momento da divulgação dos números "está próximo".

Qual é o papel de Portugal no universo Eleven Sports?
No que respeita ao volume de subscritores é um peso não muito significativo, pelo facto de a Eleven Sports estar presente em onze países, à disposição de cerca de 80 milhões de lares, onde cerca de 17 milhões desses lares são clientes premium. A estratégia muda de país para país, em função do enquadramento pay tv e em função de como a oferta de conteúdos de desporto premium estão presentes na oferta de conteúdos nesses mercados.

Mas Portugal passou a ser uma flagship, pelo facto de ter as propriedades mais relevantes: somos o único país da Eleven Sports em todo o mundo que tem a Liga dos Campeões, Formula 1 e se adicionarmos a La Liga somo um caso único.

Quando é que começaram as negociações com as operadoras?
Logo desde o início, penso eu.

Mas houve vários avanços e recuos. Como foi todo o processo?
Até finais de novembro de 2018, tivemos um processo negocial em que a Eleven Sports não era parte envolvida, porque estava em vigor um acordo de distribuição em exclusivo com a Nowo. Esse acordo proibia-nos de estar comercialmente ativos no mercado. Ou seja, a minha presença ou de alguém da minha equipa, estava inibida de estar presente nas negociações tidas com as operadoras.

A Nowo terá espoletado um conjunto de iniciativas no mercado para garantir a distribuição dos canais Eleven Sports em todo o mercado, mas por diversas razões essas negociações não estavam a ser tidas da forma mais objetiva. É um pressuposto meu - porque ainda não estou aqui desde o início - mas penso que terá pesado o facto de as decisões iniciais da Eleven Sports, ao entrar no mercado nacional, não enquadrarem bem o que seria ter uma operadora, concorrente das outras operadoras, a liderar essas negociação.

Por que motivo entregou a Eleven Sports à Nowo essa responsabilidade negocial?
Porque não? Quem auscultou o mercado nacional na altura ou entrava diretamente ou entrava por via de um operador. Porque é que a HBO fez um acordo exclusivo com a Vodafone? Há estratégias comerciais que são identificadas em função de enquadramentos específicos do mercado.

O objetivo sempre foi o de colocar à disposição os canais Eleven Sports nas principais operadoras?
Pelo menos desde o dia 17 de setembro de 2018, quando aqui cheguei, foi esse o objetivo. E, pela informação que tenho, antes da minha chegada o objetivo não era diferente. Sempre houve uma vontade de os canais Eleven Sports terem uma distribuição across the market.

O parceiro estava identificado mas sofreu algumas mutações ao longo do tempo, designadamente o controlo acionista. E quando há mudanças no controlo acionista, há sempre impactes nas estratégias mais globais que algumas empresas têm.

Daí a opção tomada em novembro?
Em novembro, quando para mim se tornou claro que o processo que está em curso não terá uma probabilidade de sucesso elevada, tentei mudar o rumo desse processo negocial.

A mudança que tinha de ser feita era a de provocar uma alteração na relação comercial estabelecida com a Nowo. O primeiro objetivo passou a ser o de regularizar, até ao final do ano 2018, a situação da Nowo de um ponto de vista do enquadramento de distribuição exclusivo comercial, de forma distinta, e que permitiu à Eleven Sports, desde o início de janeiro, chamar a si a responsabilidade dessas negociações.

Quem detém os direitos dos canais Eleven Sports agora?
Os direitos dos canais Eleven Sports estão na posse da Eleven Sports, do ponto de vista da distribuição comercial. Desde que houve essa alteração contratual, a Eleven Sports, designadamente na minha pessoa, esteve diretamente no mercado a discutir com as operadoras os contratos de distribuição por via de negociações diretas, bilaterais e exclusivas. Negociamos com todos, incluindo a Nowo.

Como ficou a Nowo, então?
Ao mesmo tempo que negociámos com a Nos, Vodafone e Meo, renegociámos com a Nowo. Foi feito um cut-off na distribuição e a Nowo passou estar na mesma posição que está a Vodafone, a Nos e Meo. Do ponto de vista da relação comercial discutida, todas as operadoras com direito de transmissão dos canais da Eleven Sports estão em pé de igualdade.

É verdade que Andrea Radrizzani, fundador e dono do universo Eleven Sports, esteve diretamente envolvido nas negociações com as operadoras?
Sim. A primeira pessoa que eu tive de convencer de que era preciso fazer uma mudança na relação de estratégia comercial foi o dono do negócio.

No final de novembro ou início de dezembro, tive uma conversa com o Andrea Radrizzani, que pela relação de confiança que tem comigo deu-me carta branca para reorientar a nossa estratégia comercial, no que respeita à abordagem local ao mercado. Pedi-lhe 30 dias para resolver a situação com a Nowo e pedi também tempo da sua agenda para poder vir a Lisboa, no início de janeiro, ter uma conversa com todos os operadores. Depois da situação resolvida com a Nowo, [Andrea Radrizzani] reuniu num único dia, separadamente, com todos os administradores e CEO das operadoras em Portugal, para explicar o motivo pelo qual achava que nós [Eleven Sports Portugal] estávamos em melhores condições de ir diretamente ao mercado e afirmar de forma objetiva que a Eleven Sports detinha os direitos de negociação.

Porquê a necessidade dessa intervenção?
Porque dentro de uma relação de transparência e proximidade no mercado nacional, fazia todo o sentido ter o shareholder numa reunião, num determinado momento, visitando no mesmo dia os quatro operadores, tendo essa discussão cara-a-cara para afirmar que ‘a partir de agora este senhor [Jorge Pavão de Sousa] fica responsável por liderar as negociações comerciais convosco, sendo que estamos a trabalhar para um determinado objetivo’.

Que objetivo era esse?
Chegar ao dia 12 de fevereiro, dia em que retomaram os jogos da Liga dos Campeões, em que o FC Porto é a única equipa portuguesa em prova, com os acordos assinados.

Os acordos com as quatro operadoras são diferentes? O que diferencia cada um desses acordos ou que critérios definiram os acordos?
Depende do que cada um quer. Um dos fatores é a taxa de crescimento [em número de clientes], outro fator é a garantia de uma menor possibilidade de 'bandelização' da oferta com outros produtos dos operadores e a questão de como integrar a nossa plataforma overt-the-top [OTT] dentro de uma proposta combinada de negócio. Uma das grandes complexidades de negociação era onde é que ficava a plataforma OTT.

E como ficou a plataforma OTT?
A operação OTT era independente da negociação dos canais, porque nunca iremos abdicar de uma estratégia OTT, uma vez que o mundo está a mudar, do ponto de vista do mercado de televisão paga, e porque queremos garantir que temos independência para em qualquer momento da  nossa operação, em Portugal,  colocarmos mais foco na plataforma 'OTT vs Pay tv [televisão paga]'. Mas só no caso de chegarmos a um momento em que achamos que as operadoras, de forma mais ou menos combinada, não querem puxar pelo nosso produto.

Para a Eleven Sports qual é a estratégia que melhores resultados gera, em Portugal, no que respeita à captação de subscritores? Plataforma OTT ou Pay TV?
Neste momento está muito equilibrado, mas até entrarmos nas quatro operadoras foi a operação OTT que nos permitiu chegar perto dos seis dígitos, sobretudo durante a fase de grupos da Liga dos Campeões [cujos direitos são detidos em exclusivo pela Eleven Sports no mercado português].

A Vodafone, Nos e Altice, dona da Meo, são acionistas da Sport TV, principal concorrente da Eleven Sports Portugal. Isso não causa nenhum receio, no limite, um conflito de interesses?
Não vou comentar como é que devem intervir, enquanto acionistas. A garantia da nossa independência no mercado nacional é feita de forma objetiva, utilizando duas alavancas: uma relação diferenciada com cada um dos operadores; e a permanência do controlo da nossa operação OTT.

Dada a relação que os operadores têm imprimido na nossa equipa, desde que chegámos a acordo, estamos a trabalhar de forma objetiva e conjunta para termos um crescimento saudável e natural de um parque de canais, dentro das suas bases de clientes e que os próprios ambicionavam poder aceder.

Entre agosto e fevereiro, o que aconteceu em Portugal foi que uma oferta muito apelativa de um conjunto de conteúdos desportivos não estava disponível à maioria e isso criou no mercado um incentivo de procura, de forma paralela, a esses conteúdos. Refiro-me, nomeadamente, à pirataria e ao acesso ilegal a esses conteúdos que deve ter aumentado de forma exponencial e isso terá tido um impacto no negócio e na natureza dos serviços das operadoras. Essa realidade também foi um incentivo para as operadoras.

Porquê?
Quando os operadores perceberam o valor da nossa oferta, o valor da nossa marca e a forma como os portugueses ambicionavam ter a nossa oferta nos seus televisores, surgiu um diálogo muito construtivo. Todos temos a ambição de crescer e em função dos negócios que estão estabelecidos existe o incentivo comercial de captar mais clientes.

O nosso desígnio, enquanto empresa, é criar um conjunto de incentivos de ação-resposta com cada uma dos operadoras em ações de promoção de forma diferenciada.

Essas ações respondem a que objetivos?
Do ponto de vista comercial, temos operadores que têm o objetivo de capturar clientes triple play [3P] e quadruple play [4P]. Também temos operadores que têm o objetivo de acelerar a penetração da sua oferta fixa na sua oferta móvel e temos operadores que são muito grandes na oferta de Pay Tv e na oferta fixa e querem acrescer a sua componente móvel de forma integrada na sua estratégia.

Em função dessas estratégias comerciais diferenciadas colocaram-nos o desafio de ‘por favor ajudem-nos a acelerar essa convergência ou a penetração 'móvel-fixo' ou 'fixo-móvel', com os vossos conteúdos e colocando em cima da mesa opções que nos permita essa linha de estratégia comercial’.

Com o acordo assinado qual é o próximo passo? As metas da Eleven Sports foram antecipadas?
As metas já eram agressivas e continuam a ser, mas não foram antecipadas. Temos, claramente, vontade de ser o operador número um de conteúdos desportivos premium, em Portugal, no final da época desportiva 2020/2021, ou seja, no final do primeiro ciclo. Há, contudo, dinâmicas de mercado que não controlamos, como o pricing da concorrência, por exemplo.

Os preços da Eleven Sports Portugal poderão subir no futuro?
Não temos nada previsto. Pelo contrário, queríamos manter estes preços o máximo tempo possível, até porque a nossa oferta de conteúdo é muito atrativa e forte o suficiente para que não nos obrigue a rever preços. Mas se acharmos que vamos trazer maior competitividade para o mercado nacional de Pay Tv indo buscar mais conteúdo, provavelmente aí haverá um motivo para rever a oferta.

Por que motivo é que a Sport TV nunca teve um concorrente?
Estamos perante um mercado que tem uma penetração Pay Tv muito elevada, superior a 90%, com quase 4 milhões de lares. Se olharmos para os dados da Anacom, o pico de penetração de quase 21,5% foi alcançado entre 2012 e 2013 e os dados do ano passado [2018] indicam que essa penetração está à volta dos 11,5%. Isto significa que 11,5% de quase 4 milhões de lares tem produto premium. Ou seja, entre 450 mil a 500 mil lares têm capacidade para pagar adicionalmente um produto premium de desporto, que ate à data foi sempre um produto muito caro.

Esse produto premium de desporto tem um preço médio de entrada de cerca de 25 euros, depois há um pacote a rondar os 30 euros e ainda há um perto de 35 euros. Como consumidores racionais, se pensarmos que podemos comprar um serviço 3P por 32 euros, na maior parte das operadoras, ou um serviço 4P abaixo dos 40 euros e adicionar um cartão móvel e, acima disso, adicionar uma oferta premium de desporto, o resultado é um valor que pesa muito no bolso dos portugueses.

A isso ainda acrescem os períodos de negociação dos direitos de transmissão.
O facto de ser um mercado limitado em termos de volume e com um preço de entrada caro, penso que qualquer operador internacional que olhe para Portugal terá de estar sempre muito atento aos momentos de renegociação de direitos. Quando as renegociações ocorrem em momentos diferentes e as maturidades dos contratos não estão alinhadas, alguém que entrasse em Portugal iria comprar propriedades de conteúdos, mas sem conseguir acrescentar valor.

A oportunidade da Eleven Sports foi identificar o momento em que havia um conjunto de propriedades de conteúdos que estavam a ir ao mercado e de enfoque - atacar no momento certo, dando o preço certo ao produto e mostrar a quem detém esses direitos que fazemos as coisas de forma diferente. É que com a mesma empresa a trabalhar da mesma maneira o produto - alguns há mais de dez, doze ou quinze anos -, acaba-se por cair na rotina e fazer as coisas de forma indiferenciada.