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Risco da dívida: Afastamento entre Portugal e Itália não elimina efeito contágio

Orçamento do Estado e 'rating' dividem a percepção de risco de investidores e agências de notação financeira sobre as repúblicas portuguesa e italiana. A dívida portuguesa não está, no entanto, imune ao efeito contágio das subidas dos juros italianos.

As diferenças entre a perceção do risco que Portugal e Itália representam têm-se acentuado, com a dívida portuguesa a ganhar renovada confiança e a italiana a ser alvo de dúvidas. Nos últimos dias, a cisão tornou-se mais profunda, com a apresentação dos Orçamentos do Estado de ambos os países e decisões de rating contrárias pela mesma agência.

O efeito contágio pode, no entanto, fazer sombra ao brilharete português. A yield das Obrigações de Itália a 10 anos tocaram esta sexta-feira os 3,810%, o valor mais elevado em quase cinco anos e acabaram por fechar a sessão nos 3,483%. No caso de Portugal, a yield subiu para 2,019% e em Espanha para 1,735%.

A subida no prémio de risco italiano aconteceu depois de o comissário europeu Pierre Moscovici ter ido a Roma pressionar o Governo para as metas orçamentais apresentadas no OE. Apesar de Bruxelas estar "sensível" às pressões políticas em Itália, não aceita os "óbvios desvios significativos" da proposta face às regras europeias.

Orçamento analisado ao pormenor na Europa

A meta inscrita do défice de 2,4% do PIB italiano em 2019 representa não só um risco de “não-conformidade grave” com as regras europeias como uma derrapagem orçamental “sem precedentes” no país. Apesar de Portugal (bem como quatro outros países) também ter recebido uma carta de Bruxelas a pedir clarificações sobre o OE, a Comissão distinguiu Itália como sendo o caso mais preocupante no conjunto.

O secretário de Estado Adjunto e das Finanças e representante de Portugal no Eurogrupo, Ricardo Mourinho Félix, garantiu, em entrevista ao Jornal Económico, que o conjunto está a acompanhar a situação, mas a "olhar para esse problema com tranquilidade", disse.

"Já foi entregue o orçamento da Itália, agora vamos analisar face aquilo que é o enquadramento europeu. Serão emitidas as recomendações necessárias. É um processo que está definido, que a Itália conhece e que caberá ao país e às instituições europeias definir aquilo que seja um orçamento que cumpra as regras basilares daquilo que é a norma euro no que diz respeito às questões orçamentais", afirmou.

Quem já fez a análise foi a Moody's. A agência de notação financeira cortou o rating de Itália de 'Baa2' para 'Baa3' – a apenas um nível de cair para a categoria de 'lixo' financeiro - e manteve a perspetiva estável, esta sexta-feira.

Roma garante que saída do euro não é hipótese

downgrade foi justificado sobretudo pelo facto de o governo de Roma antecipar um défice orçamental para os próximos anos superior àquele que a agência estimava inicialmente. “Além disso, a tendência da dívida pública é vulnerável e as perspetivas de crescimento económico mais fracas, o que poderá fazer com que o índice da dívida pública suba ainda mais do seu nível já elevado”, explicou a agência.

A Moody's antecipa que a dívida pública italiana estabilize e mantenha-se próxima dos atuais 130% do PIB (em vez de iniciar uma tendência de descida, como seria esperado), o que justifica o nível de classificação, de risco moderado.

O ministro dos Assuntos Europeus italiano, Paolo Savona, reagiu à decisão, tentando dar maior confiança aos investidores de que o Governo está focado na estabilidade. "Não há qualquer hipótese, no que diz respeito a Itália e ao meu governo, de que a dívida pública da Itália corra o chamado risco de redenominação, que possa rejeitar o euro. Se este evento acontecer, será por motivos fora da vontade do país", disse numa conferência, citado pela agência Reuters.

Caminhos diferentes para o mesmo rating

rating de Portugal e de Itália ficaram, assim, no mesmo difícil na avaliação da Moody's. A diferença foi o caminho realizado até esse nível A agência divulgou o relatório sobre a dívida italiana que efetivou o downgrade apenas duas semanas depois de se ter pronunciado sobre Portugal. Mas nesse caso subiu o rating de Portugal para o nível Baa3, com perspetiva estável.

A agência de notação financeira referiu que o upgrade de Portugal foi justificado pela descida do elevado nível de endividamento, bem como o crescimento económico do país. A agência norte-americana tirou, assim, a dívida portuguesa do 'lixo' - nível em que estava há sete anos - e juntou-se às restantes maiores agências do mundo, que também já tinham dado este passo após a crise.

Em relação a Itália, a Standard and Poor's, que avalia atualmente a dívida do país dois níveis acima do 'lixo', deverá pronunciar-se a 26 de outubro. A Fitch, que mudou em agosto a perspetiva do país para negativa mantendo o rating de crédito de longo prazo inalterado, não tem mais avaliações marcadas este ano, mas poderá realizar uma revisão caso veja que os riscos justificam um downgrade.

Governo português confia na notação em níveis pré-crise

Do lado de Portugal, o Governo já pisca o olho a novas subidas. "Creio que temos condições para regressar ao nível de rating antes da crise financeira pois temos uma economia mais equilibrada e mais assente no crescimento proporcionado pelas exportações e mais equilibrado do ponto de vista da balança", afirmou Mourinho Félix na mesma entrevista ao Jornal Económico.

A Moody's e a Standard and Poor's avaliam o rating da República apenas um nível acima de 'lixo', enquanto a Fitch e a DBRS colocam Portugal um degrau acima. Ainda assim, o nível continua abaixo dos antes antes da crise e da troika.

Para justificar a confiança em novas subidas, o secretário de Estado lembra que, então, o défice da balança portuguesa era de 10%, o que compara com um ligeiro excedente atual.

"Faz toda a diferença para aqueles que nos emprestam dinheiro e para aqueles nos financiam. É isso que as agências de ratings avaliam, a nossa capacidade de pagar aquilo que pedimos emprestado. Essa avaliação que seguramente melhorará, assim que seja conduzido política responsável com crescimento inclusivo e com criação de emprego de qualidade", acrescentou.